É regra geral no direito
civil brasileiro que o causador de um dano à outra pessoa tem a obrigação de
repará-lo por meio de indenização. Se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão
solidariamente pela reparação. Mas quando o verdadeiro culpado pelo dano é
alguém que não foi atingido na ação de indenização, contra ele cabe a chamada
ação regressiva.
Com o estado não é
diferente. O artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal estabelece que
“as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de
serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem
a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de
dolo ou culpa”.
Vejamos, então, alguns
entendimentos firmados pelo STJ nesta seara.
Erro médico
1. Nas
ações de indenização fundadas na
responsabilidade civil objetiva do Estado (CF/88,
art. 37, § 6º), não é obrigatória a
denunciação a lide do agente supostamente
responsável pelo ato lesivo (CPC, art. 70, III).
2. A denunciação a lide do servidor público nos casos de indenização fundada na responsabilidade objetiva do Estado não
deve ser considerada como obrigatória, pois impõe ao
autor manifesto prejuízo à celeridade na prestação jurisdicional.
Haveria em um mesmo
processo, além da discussão
sobre a responsabilidade objetiva referente à lide originária, a
necessidade da verificação da responsabilidade
subjetiva entre o ente público e o agente causador do dano, a
qual é desnecessária e irrelevante para o eventual ressarcimento do particular. Ademais, o direito de regresso do ente
público em relação ao servidor, nos casos de dolo ou culpa, é assegurado no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, o qual
permanece inalterado ainda que inadmitida a denunciação da lide.
3. Recurso especial desprovido. (REsp 1.089.955, 1ª Turma, Ministra
Relatora Denise Arruda, 03.11.09).
Erro
médico em hospital privado
Segundo a jurisprudência
do STJ, a responsabilidade do hospital pelos danos causados por profissional
que nele atua é objetiva, ou seja, independe de dolo ou culpa. O dever de
indenizar decorre apenas da existência do dano. Uma vez condenado, o hospital
pode averiguar a responsabilidade subjetiva do médico, ou seja, sua culpa, em
ação de regresso.
Prescreve
em três anos a pretensão de reparação civil (CC, art. 206, § 3º, V). E, em caso
de ação de regresso, proposta pelo que reparou o dano contra o causador, o
prazo prescricional inicia com a reparação, ou seja, com o efetivo pagamento da
indenização (AResp 182.368, Relator Ministro Marco Buzzi, 01.08.2012).
Furto de
veículo
Em caso interesse julgado
pelo STJ, um consumidor, que tinha seguro do seu carro, estacionou o veículo
num estacionamento particular, de onde seu carro foi roubado. O consumidor
acionou o seguro e recebeu a indenização conforme os termos de sua apólice.
Nas
relações de consumo, onde valem as regras do Código de Defesa do Consumidor
(CDC), o STJ entende que é proibida a denunciação da lide em todas as hipóteses
de ação de regresso, conforme estabelece o artigo 88 do código.
Pois bem, considerando que
o veiculo estava em estacionamento particular, a seguradora ajuizou ação
regressiva contra o estabelecimento garagista, que também tinha seguro.
Para o STJ, não há como considerar
o furto ou roubo de veículo causa excludente de responsabilidade das empresas
que exploram o estacionamento de automóveis, na medida em que a obrigação de garantir da integridade
do bem é inerente à própria atividade por elas desenvolvida. Hodiernamente, o
furto e o roubo de veículos constituem episódios corriqueiros,
sendo este, inclusive, um dos principais fatores
a motivar a utilização dos estacionamentos,
tornando inconcebível que uma empresa que
se proponha a depositar automóveis em
segurança enquadre tais modalidades criminosas
como caso fortuito.
Dessa forma, o
estabelecimento garagista ressarciu a seguradora daquilo que havia pago ao seu
consumidor. (Resp 976.531, 3ª Turma, Ministra Relatora Nancy Andrighi,
23.02.2010).
Acordo
judicial
1. Uma
transação judicialmente homologada diferencia-se de uma sentença judicial por
sua gênese, não por seus efeitos. Tanto
numa situação como na outra, a composição do litígio produz efeitos de
por fim à controvérsia, e esses efeitos não podem ser ignorados, nem pelas
partes do processo, nem por terceiros.
2. É cediça a
diferenciação, proposta por Liebman, entre
eficácia da sentença e autoridade da coisa julgada. A sentença é eficaz
perante todos, mas imutável apenas para as partes do processo. Do mesmo modo, o
acordo judicialmente homologado é um ato jurídico que
tem existência e efeitos que se irradiam
no ordenamento jurídico, não podendo ser
reputado inexistente por terceiros juridicamente
interessados no resultado do processo.
3. Se uma ação de
indenização proposta em face da parte a quem se imputa responsabilidade
objetiva pelo dano se encerra por
acordo, é possível à empresa que
indenizou a vítima exercer, em regresso,
pretensão de restituição do valor pago em
face do responsável final. Nessa
ação de regresso, o acordo funcionará como limite da indenização a ser
restituída, mas não vinculará o responsável final, que poderá discutir
todas as questões tratadas no processo anterior,
do qual emergiu a indenização. Mas o princípio da
relatividade dos contratos não impede que a ação de regresso seja
ajuizada. (REsp
1.246.209, 3ª Turma, Ministra Relatora Nancy Andrighi, 19.06.2012).
Extravio
de bagagem
No Resp 1.181.252, o STJ
decidiu caso em que uma consumidora tinha seguro de viagem e após extravio de
sua bagagem foi ressarcida pelo Bradesco Seguros que ingressou com ação
regressiva contra a Varig Logística, responsável pelo extravio.
De acordo com a jurisprudência
da Corte Superior, depois de arcar com a indenização securitária, a seguradora
assume os direitos da segurada, podendo buscar o ressarcimento do que gastou,
nos mesmos termos e limites assegurados à consumidora.
A Varig queria a aplicação
da Convenção de Varsóvia, que unifica as regras de transporte aéreo
internacional, inclusive trazendo valores das indenizações. Contudo,
já está consolidada no STJ a tese de que o tratado é inaplicável no caso de
responsabilidade do transportador aéreo pelo extravio de carga. A regra válida
é o CDC (Resp 1.181.252,
Ministro Paulo Sanseverino, 16.05.2012).
Carga em
navio
Como visto, o STJ entende
que, havendo o pagamento da indenização securitária, a
seguradora sub-roga-se nos direitos e ações que seriam do segurado contra o
autor do dano, inclusive com aplicação do CDC. Porém,
esse tratamento não se aplica ao transporte de mercadoria acertado entre o
transportador e a empresa que agrega essa mercadoria à sua atividade. A relação
aí não é de consumo, mas sim comercial. Nessa
hipótese, é de um ano o prazo para que a seguradora ajuíze ação de regresso
contra a transportadora visando ao ressarcimento pela perda da carga.
(Resp 1.221.880, Ministro
Massami Uyeda, 08.06.2012).
Fonte: STJ