terça-feira, 19 de março de 2013

Informativo 694 do STF – AP N. 474-DF - RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA.


Ofensas proferidas que exorbitam os limites da crítica política: publicações contra a honra divulgadas na imprensa podem constituir abuso do direito à manifestação de pensamento, passível de exame pelo Poder Judiciário nas esferas cível e penal.

A difamação, como ocorre na calúnia, consiste em imputar a alguém fato determinado e concreto ofensivo a sua reputação, de modo que necessária a descrição do fato desonroso, do contrário, a imputação genérica configura simples injúria.

Confira-se alguns trechos da injúria:

EU NÃO TENHO MEDO DE BANDIDO, NÃO TENHO MEDO DE CHEFE DE QUADRILHA. SE O SENHOR FOSSE UMA PESSOA DIGNA, O SENHOR NÃO TERIA SIDO PRESO, SE O SENHOR FOSSE UMA PESSOA DE CONDUTA ÉTICA, O SENHOR NÃO TERIA SIDO PRESO’. (...) SÓ QUE VOCÊ NÃO É HOMEM, HOMEM. NEM PRA SER MULHER VOCÊ PRESTA, NEM PRA SER GAY VOCÊ PRESTA ADEMIR ANDRADE. VOCÊ É UM COVARDE’. (...) ‘TU É CHEFE DE QUADRILHA, É VAGABUNDO, É BANDIDO ADEMIR’ ‘SAIBA QUE VOCÊ É UM CACHORRO MORTO, E VOCÊ NÃO É HOMEM PARA FAZER NADA COM NINGUÉM. VOCÊ É UM DESMORALIZADO, PORQUE VOCÊ É LADRÃO, VOCÊ ROUBOU O ERÁRIO PÚBLICO.

Entendeu-se que a utilização da expressão ‘Chefe de quadrilha ameaça Deputado Federal dentro do avião da TAM’ foi feita unicamente para chamar a atenção do público, não havendo qualquer relação com fato específico apto a configurar o crime de difamação.

Doutrina citada no acórdão:

Nesse sentido são as lições de Luiz Regis Prado:
A difamação foi erigida à categoria de delito autônomo com o advento do atual Código Penal (1940), que a disciplina em seu Capítulo V, artigo 139. A difamação consiste na imputação de fato não-delituoso, ofensivo à reputação de alguém. A rigor, a calúnia nada mais é do que uma modalidade agravada da difamação. Algumas legislações – como o Código Penal italiano – não fazem distinção entre calúnia e difamação, optando por tratá-las conjuntamente, sob a denominação comum de difamação (art. 595). (…)
A exemplo da calúnia, também na difamação o fato imputado deve ser determinado. Não há, porém, a exigência de descrição detalhada, isto é, não é preciso que o agente narre em todos os pormenores. Basta que a imputação seja clara o suficiente para que se individualize o fato desonroso que se atribui (…).
O fato desonroso, portanto, é todo acontecimento concreto, pretérito ou presente, desde que não se encontre apenas no plano do imaginário ou provável – como quando se diz que alguém é bem capaz de praticar tal conduta desonrosa. Os fatos genericamente enunciados, os de realização provável e os julgamentos sobre qualidades atribuídas à vítima não configuram difamação, mas injúria. A difamação consiste no relato de fato preciso, que, pelas circunstâncias em que é enunciado, se torne digno de crédito. Dizer, por exemplo, que alguém é um ‘devasso’ caracteriza a injúria; todavia, afirmar que frequenta certo prostíbulo, difamação. Às vezes é muito difícil traçar a exata distinção entre a atribuição de fato (difamação) e a atribuição de qualidade (injúria). Na dúvida, é de prevalecer essa última, em virtude de seu caráter menos gravoso.
A difamação se distingue da injúria por consistir na imputação de acontecimento ou de conduta concreta, e não na expressão de simples juízo de valor depreciativo” (PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro, volume 2: parte especial: arts. 121 a 183. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. pp. 233-236)

No mesmo sentido são os ensinamentos de Guilherme de Souza Nucci: “é preciso que o agente faça referência a um acontecimento, que possua dados descritivos como ocasião, pessoas envolvidas, lugar, horário, entre outros, mas não um simples insulto. Dizer que uma pessoa é caloteira configura uma injúria, ao passo que espalhar o fato de que ela não pagou aos credores A, B e C, quando as dívidas X, Y e Z venceram no dia tal, do mês tal, configura a difamação” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 4 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 467).

No mesmo sentido a clássica lição de Nelson Hungria (Comentários ao Código de Processo Penal. v. VI, p. 84/85), que, ao analisar os elementos do tipo (difamação), esclarece que “(...) consiste na imputação de fato que, embora sem revestir caráter criminoso, incide na reprovação ético-social e é, portanto, ofensivo à reputação da pessoa a quem se atribui. Segundo já foi acentuado, é estreita a sua afinidade com a calúnia. Como esta, é lesiva da honra objetiva (reputação, boa fama, valor social da pessoa) e por isto mesmo, supõe necessariamente a comunicação a terceiro. Ainda mais: a difamação, do mesmo modo que a calúnia, está subordinada à condição de que o fato atribuído seja determinado. Há, porém, diferenças essenciais entre uma e outra dessas modalidades de crime contra a honra: (…) enquanto na difamação o fato imputado incorre apenas na reprovação moral, e pouco importa que a imputação seja falsa ou verdadeira”.

Fonte: STF

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