A regra do artigo 114, inciso I, da
Lei de Execução Penal (LEP) – a qual exige para a progressão ao regime aberto
que o condenado esteja trabalhando ou comprove a possibilidade imediata de
trabalho – deve ser interpretada em consonância com a realidade social, para
não tornar inviável a finalidade de ressocialização almejada na execução penal.
Embora as pesquisas revelem redução
significativa na taxa de desemprego no Brasil, “a realidade mostra que as
pessoas com antecedentes criminais encontram mais dificuldade para iniciar-se
no mercado de trabalho (principalmente o formal), o qual está cada vez mais
exigente e competitivo”.
Se, de um lado, não é razoável
condicionar a progressão de regime à demonstração prévia de ocupação lícita, de
outro lado, também não é aceitável deixar de observar às regras concernentes à
Execução Penal e seus princípios basilares.
O que se espera do reeducando que se
encontra no regime aberto é sua reinserção na sociedade, condição esta
intrinsecamente relacionada à obtenção de emprego lícito, o qual poderá ser
comprovado dentro de um prazo razoável, a ser fixado pelo juiz da execução.
Precedentes:
HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME
CARCERÁRIO. DEFERIMENTO DO REGIME ABERTO PELO JUÍZO DAS EXECUÇÕES. CASSAÇÃO
PELO TRIBUNAL A QUO. FALTA DE COMPROVAÇÃO DE TRABALHO. EXEGESE DO ART. 114, I,
DA LEP. TEMPERAMENTO. ESTIPULAÇÃO DE PRAZO PARA A BUSCA E OBTENÇÃO DE OCUPAÇÃO
LÍCITA. RAZOABILIDADE. ORDEM CONCEDIDA. 1. A Sexta Turma deste Tribunal
Superior consagrou o entendimento de que a regra do art. 114, I, da LEP, a qual
exige do condenado, para ingressar no regime aberto, a comprovação de trabalho
ou a possibilidade imediata de fazê-lo (apresentação de proposta de emprego),
deve sofrer temperamentos, ante a realidade da população carcerária do país.
Assim, de acordo com o princípio da razoabilidade, deve-se conceder ao apenado
um prazo de 90 dias, para, em regime aberto, procurar e obter emprego lícito,
apresentando, posteriormente, a respectiva comprovação da ocupação. Precedente:
HC 147.913/SP. 2. Ordem concedida para restabelecer a decisão de primeiro grau
que deferiu à paciente a progressão de regime para o aberto e estipular o prazo
de 90 (noventa) dias para que se demonstre a obtenção de trabalho lícito,
formalizado em termo de compromisso. (HC 213303/SP, Relator Ministro VASCO
DELLA GIUSTINA - DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS -, DJe 27/02/2012 )
PENAL. EXECUÇÃO. REGIME ABERTO. PROGRESSÃO.
TRABALHO LÍCITO. REQUISITO. DEMONSTRAÇÃO. PRAZO RAZOÁVEL. CONCESSÃO.
POSSIBILIDADE. 1. A decisão do juízo da execução de facultar ao apenado, dentro
de 90 dias da concessão da progressão ao regime aberto, a comprovação de ter obtido
um emprego lícito, é a interpretação do art. 114 da LEP que se coaduna com a
realidade da população carcerária do país e, pois, é a que mais dá efetividade
ao dispositivo. 2. A experiência mostra que, estando a pessoa presa, raramente
ela tem condições de, desde logo, ao fazer o pedido, demonstrar o trabalho com
carteira assinada. Normalmente, então, como o fez corretamente, na espécie, o
magistrado de primeiro grau, concede-se um prazo para que o apenado possa, em
regime aberto, obter um trabalho e apresentar este comprovante. 3. Ordem
concedida para manter a decisão do juiz que promoveu o paciente ao regime
aberto. (HC 147913/SP, Relatora p/ Acórdão Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS
MOURA, DJe 11/04/2012)
EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. PROGRESSÃO AO REGIME
ABERTO. BENEFÍCIO CONCEDIDO NO JUÍZO SINGULAR. DECISÃO CASSADA PELO TRIBUNAL A
QUO. EXIGÊNCIA DE PROPOSTA DE EMPREGO. RECOLOCAÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO.
DIFICULDADES. FLEXIBILIZAÇÃO DA NORMA. GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. LONGA PENA
A CUMPRIR. FUNDAMENTOS INSUFICIENTES. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM
CONCEDIDA.
I. Na hipótese, o reeducando cumpriu todos os
requisitos exigidos pelo art. 112 da LEP para obter a progressão ao regime
prisional aberto, entendendo o magistrado de primeiro grau que o pressuposto
estampado no inciso II, do art. 114 daquela norma também estaria preenchido. II.
Diante do quadro brasileiro e até mesmo mundial, a registrar uma grave crise
empregatícia, exigir-se a apresentação de comprovante de emprego das pessoas
oriundas do sistema carcerário, nem sempre se mostra viável, redundando, quase
sempre, na vedação in abstrato à pretendida progressão. III. Se a oferta de
emprego está escassa até mesmo para aqueles que não possuem algum antecedente
penal, imagina-se impor tal obrigação a quem já registra alguma condenação. IV.
A flexibilização não significa dizer que o sentenciado progredido ao regime
aberto esteja desobrigado de trabalhar e manter ocupação licita, encargo do
qual somente estão dispensados as pessoas relacionadas no art. 117 da LEP, nos
termos do art. 114, parágrafo único, da mesma lei. V. O julgador deve buscar
uma interpretação teleológica que vise à consecução dos objetivos de
proporcionar as condições para uma harmônica integração social do condenado e
do internado, de maneira que eles, em virtude de seus antecedentes e histórico
prisional, se apresentarem merecimento e empenho para recolocarem-se dignamente
no mercado de trabalho, poderão obter a progressão de regime, ainda que estejam
desempregados. VI. A jurisprudência
desta Corte é pacífica no sentido de que a gravidade dos delitos praticados,
tomada abstratamente e por si só, bem como o montante da pena a ser cumprida,
não são fundamentos idôneos para o indeferimento de pedido de progressão de
regime. Precedentes. VII. À vista da demonstração do preenchimento de quase
todos os requisitos legais para progredir ao regime prisional aberto, deve ser
mantido o beneficio deferido ao paciente na instância de primeiro grau. VIII.
Ordem concedida, nos termos do voto do Relator.(HC 217180/RJ, Relator Ministro
GILSON DIPP, DJe 22/03/2012 )
Fonte: STJ
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