Julgado riquíssimo.
Resumo
dos fatos: Em 2007, uma criança de 08 meses foi internada em um Hospital
Público do Distrito Federal com tosse seca, coriza hialina e obstrução nasal,
dispneia, febre, hipoatividade e falta de apetite. O quadro se agravou e, como
o hospital público não tinha condições adequadas para o seu tratamento, os
médicos sugeriram a transferência para um hospital particular, o que fez com os
pais demandassem a justiça, conseguindo uma liminar judicial determinando a
internação em estabelecimento privado que tivesse vaga com pagamento das
despesas pelo Distrito Federal. Mesmo diante da cópia da decisão, impressa a partir do site do Tribunal
de Justiça do Distrito Federal, o Hospital Santa Lúcia se recusou a receber a
criança, alegando que não fora
oficialmente intimado. Mantido na enfermaria do hospital
público, sem os equipamentos necessários para sua sobrevivência, o bebê não
resistiu.
O
que decidiu o STJ?
1. O caso
foi decidido à luz da teoria
da perda da chance de cura ou sobrevivência (perte d’une chance de survie ou
guérison). Embora não haja provas de que a morte da criança tenha sido
causada diretamente pela omissão de socorro, já que seu quadro de saúde era grave,
a atitude do hospital em
não atender a menor reduziu “substancialmente” suas possibilidades de
sobrevivência.
2. O
hospital tinha a obrigação legal de prestar socorro, mas se omitiu e privou a
paciente da chance de receber um tratamento que talvez a pudesse salvar ou,
pelo menos, garantir uma sobrevida.
3.
A Constituição, além de consagrar a dignidade
da pessoa humana como um dos fundamentos da República, determina o direito de
todos à saúde e o Estatuto da Criança e do Adolescente reafirma as garantias à saúde e à prioridade de
atendimento hospitalar, em especial de crianças e adolescentes.
4. A atitude
de privilegiar trâmites burocráticos em detrimento do atendimento a paciente em
estado grave “não tem respaldo legal ou moral” e configura um atentado à
dignidade da pessoa humana.
5.
Não se pode recusar a validade de
decisão judicial contida no site do tribunal local, pois o próprio STJ já
decidiu que as informações publicadas nesse meio têm valor legal. Com o advento da Lei 11.419/06, que veio
disciplinar o uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, comunicação
de atos e transmissão de peças processuais, acredita-se que a tese de que as informações processuais
fornecidas pelos sites oficiais dos tribunais somente possuem cunho informativo
perdeu sua força, na medida em que,
agora, está vigente a legislação necessária para que todas as informações
veiculadas pelo sistema sejam consideradas oficiais.
6. Na
ação intentada contra o hospital particular, os pais pediram indenização por
danos morais e materiais, incluindo pensionamento, contudo o STJ apenas concedeu
danos materiais no valor de R$ 50.000,00 para cada um dos pais, sob o argumento
de que o direito
brasileiro adota o princípio de que “ninguém pode ser responsabilizado por
aquilo a que não tiver dado causa”– e causa, para esse efeito, é apenas “o
evento que produziu direta e concretamente o resultado danoso”.
7. Para
o STJ é indiscutível que o
hospital pode não ter causado diretamente o resultado morte”, mas tinha
a obrigação legal de usar os recursos disponíveis para tentar impedi-lo e não o
fez, “privando a paciente de uma chance de receber tratamento digno que,
talvez, pudesse lhe garantir uma sobrevida”. A perda da chance está em relação de causalidade não com
o evento morte, mas com a interrupção do tratamento que o hospital tinha a
obrigação jurídica de proporcionar, ainda que nunca se venha a saber se geraria
resultado positivo ou negativo para a vítima. O que se indeniza na responsabilidade por
perda da chance outra coisa não é senão a própria chance perdida.
8. O pedido
de pensionamento foi rejeitado por que para a 3ª Turma o que os pais perderam
foi a chance do tratamento e não a continuidade da vida de sua filha. Considerando
que não há como ter certeza de que, ainda que prestado o atendimento de
emergência de forma adequada, a paciente sobreviveria, a indenização deve
ater-se apenas ao dano moral, excluído o material. Mesmo porque, não se pode
indenizar o possível resultado, afirmou o ministro.
Fonte:
STJ
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