sábado, 9 de fevereiro de 2013

STJ - Hospital terá de indenizar pais de bebê que morreu sem atendimento – REsp 1335622 – 3ª Turma - Ministro relator Ricardo Villas Bôas Cueva– 07.02.2013


Julgado riquíssimo.

Resumo dos fatos: Em 2007, uma criança de 08 meses foi internada em um Hospital Público do Distrito Federal com tosse seca, coriza hialina e obstrução nasal, dispneia, febre, hipoatividade e falta de apetite. O quadro se agravou e, como o hospital público não tinha condições adequadas para o seu tratamento, os médicos sugeriram a transferência para um hospital particular, o que fez com os pais demandassem a justiça, conseguindo uma liminar judicial determinando a internação em estabelecimento privado que tivesse vaga com pagamento das despesas pelo Distrito Federal. Mesmo diante da cópia da decisão, impressa a partir do site do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, o Hospital Santa Lúcia se recusou a receber a criança, alegando que não fora oficialmente intimado. Mantido na enfermaria do hospital público, sem os equipamentos necessários para sua sobrevivência, o bebê não resistiu.

O que decidiu o STJ?

1.  O caso foi decidido à luz da teoria da perda da chance de cura ou sobrevivência (perte d’une chance de survie ou guérison). Embora não haja provas de que a morte da criança tenha sido causada diretamente pela omissão de socorro, já que seu quadro de saúde era grave, a atitude do hospital em não atender a menor reduziu “substancialmente” suas possibilidades de sobrevivência.

2.   O hospital tinha a obrigação legal de prestar socorro, mas se omitiu e privou a paciente da chance de receber um tratamento que talvez a pudesse salvar ou, pelo menos, garantir uma sobrevida.

3.   A Constituição, além de consagrar a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República, determina o direito de todos à saúde e o Estatuto da Criança e do Adolescente reafirma as garantias à saúde e à prioridade de atendimento hospitalar, em especial de crianças e adolescentes.

4.   A atitude de privilegiar trâmites burocráticos em detrimento do atendimento a paciente em estado grave “não tem respaldo legal ou moral” e configura um atentado à dignidade da pessoa humana.

5.   Não se pode recusar a validade de decisão judicial contida no site do tribunal local, pois o próprio STJ já decidiu que as informações publicadas nesse meio têm valor legal.  Com o advento da Lei 11.419/06, que veio disciplinar o uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, comunicação de atos e transmissão de peças processuais, acredita-se que a tese de que as informações processuais fornecidas pelos sites oficiais dos tribunais somente possuem cunho informativo perdeu sua força, na medida em que, agora, está vigente a legislação necessária para que todas as informações veiculadas pelo sistema sejam consideradas oficiais.

6.   Na ação intentada contra o hospital particular, os pais pediram indenização por danos morais e materiais, incluindo pensionamento, contudo o STJ apenas concedeu danos materiais no valor de R$ 50.000,00 para cada um dos pais, sob o argumento de que o direito brasileiro adota o princípio de que “ninguém pode ser responsabilizado por aquilo a que não tiver dado causa”– e causa, para esse efeito, é apenas “o evento que produziu direta e concretamente o resultado danoso”.

7.   Para o STJ é indiscutível que o hospital pode não ter causado diretamente o resultado morte”, mas tinha a obrigação legal de usar os recursos disponíveis para tentar impedi-lo e não o fez, “privando a paciente de uma chance de receber tratamento digno que, talvez, pudesse lhe garantir uma sobrevida”. A perda da chance está em relação de causalidade não com o evento morte, mas com a interrupção do tratamento que o hospital tinha a obrigação jurídica de proporcionar, ainda que nunca se venha a saber se geraria resultado positivo ou negativo para a vítima. O que se indeniza na responsabilidade por perda da chance outra coisa não é senão a própria chance perdida.

8.   O pedido de pensionamento foi rejeitado por que para a 3ª Turma o que os pais perderam foi a chance do tratamento e não a continuidade da vida de sua filha. Considerando que não há como ter certeza de que, ainda que prestado o atendimento de emergência de forma adequada, a paciente sobreviveria, a indenização deve ater-se apenas ao dano moral, excluído o material. Mesmo porque, não se pode indenizar o possível resultado, afirmou o ministro.

Fonte: STJ

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