sexta-feira, 26 de abril de 2013

STF – Informativo 696 de 2013 - Pensão vitalícia à viúva de ex-prefeito – 2ª Turma - RE 405386/RJ, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Teori Zavascki, 26.2.2013. (RE-405386).


Lei municipal que concedera à viúva de ex-prefeito, falecido no curso do mandato, pensão vitalícia equivalente a 30% dos vencimentos por ele percebidos, encontra base material de apoio na Constituição.

Não há empecilho constitucional à edição de leis sem caráter geral e abstrato, providas apenas de efeitos concretos e individualizados. Há matérias a cujo respeito a disciplina não pode ser conferida por ato administrativo, demandando a edição de lei, ainda que em sentido meramente formal. É o caso da concessão de pensões especiais.

O tratamento privilegiado a certas pessoas somente pode ser considerado ofensivo ao princípio da igualdade ou da moralidade quando não decorrer de uma causa razoavelmente justificada.

No caso, tanto a petição inicial, quanto os atos decisórios das instâncias ordinárias, se limitaram a considerar “imoral” a lei por ter conferido tratamento privilegiado a uma pessoa, sem, contudo, fazer juízo algum, por mínimo que fosse, sobre a razoabilidade ou não, em face das circunstâncias de fato e de direito, da concessão do privilégio. A se considerar imoral a lei, pelo só tratamento privilegiado a certos destinatários, certamente seriam inconstitucionais, apenas para citar um exemplo, todas as leis que estabelecem isenções fiscais.

A moralidade, como princípio da Administração Pública (art. 37) e como requisito de validade dos atos administrativos (art. 5.º, LXXIII), tem a sua fonte por excelência no sistema de direito, sobretudo no ordenamento jurídico-constitucional, sendo certo que os valores humanos que inspiram e subjazem a esse ordenamento constituem, em muitos casos, a concretização normativa de valores retirados da pauta dos direitos naturais, ou do patrimônio ético e moral consagrado pelo senso comum da sociedade.

A quebra da moralidade administrativa se caracteriza pela desarmonia entre a expressão formal (= a aparência) do ato e a sua expressão real (= a sua substância), criada e derivada de impulsos subjetivos viciados quanto aos motivos, ou à causa, ou à finalidade da atuação administrativa.

Nas palavras do Ministro Teori Zavaski:

“Não há dúvida de que a lei deu tratamento privilegiado – e, portanto, anti-isonômico - a certa pessoa, mas também isso, por si só, não pode ser considerado “imoral”. Para tanto, seria indispensável demonstrar que o tratamento discriminatório não tem qualquer motivo razoável. O que a Constituição proíbe não é, propriamente, o tratamento privilegiado, mas a concessão de privilégios injustificados e injustificáveis. Um mínimo de investigação a respeito das causas que determinaram o tratamento privilegiado seria, portanto, indispensável à declaração de nulidade por “imoralidade”. Convém enfatizar – e aqui pedimos licença para invocar o que registramos em sede doutrinária (Processo Coletivo – tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos, 5ª ed., SP:RT, 2.011, p. 82 e seguintes) - que a moralidade, tal como erigida na Constituição - como princípio da Administração Pública (art. 37) e como requisito de validade dos atos administrativos (art. 5.º,LXXIII) -, não é, simplesmente, um puro produto do jusnaturalismo, ou da ética, ou da moral, ou da religião. É o sistema de direito, o ordenamento jurídico e, sobretudo, o ordenamento jurídico-constitucional a sua fonte por excelência, e é nela que se devem buscar a substância e o significado do referido princípio. É certo que os valores humanos, que inspiram o ordenamento jurídico e a ele subjazem, constituem, em muitos casos, inegavelmente, a concretização normativa de valores retirados da pauta dos direitos naturais, ou do patrimônio ético e moral consagrado pelo senso comum da sociedade. Sob esse aspecto, há, sem dúvida, vasos comunicantes entre o mundo da normatividade jurídica e o mundo normativo não jurídico (natural, ético, moral), razão pela qual esse último, tendo servido como fonte primária do surgimento daquele, constitui também um importante instrumento para a sua compreensão e interpretação. É por isso mesmo que o enunciado do princípio da moralidade administrativa – que, repita-se, tem natureza essencialmente jurídica – está associado à gama de virtudes e valores de natureza moral e ética: honestidade, lealdade, boa-fé, bons costumes, equidade, justiça. São valores e virtudes que dizem respeito à pessoa do agente administrativo, a evidenciar que os vícios do ato administrativo por ofensa à moralidade são derivados de causas subjetivas, relacionadas com a intimidade de quem o edita: as suas intenções, os seus interesses, a sua vontade. Ato administrativo moralmente viciado é, portanto, um ato contaminado por uma forma especial de ilegalidade: a ilegalidade qualificada por elemento subjetivo da conduta do agente que o pratica. Estará atendido o princípio da moralidade administrativa quando a força interior e subjetiva que impulsiona o agente à prática do ato guardar adequada relação de compatibilidade com os interesses públicos a que deve visar a atividade administrativa. Se, entretanto, essa relação de compatibilidade for rompida – por exemplo, quando o agente, ao contrário do que se deve razoavelmente esperar do bom administrador, for desonesto em suas intenções, for desleal para com a Administração Pública, agir de má-fé para com o administrado, substituir os interesses da sociedade pelos seus interesses pessoais –, estará concretizada ofensa à moralidade administrativa, causa suficiente de nulidade do ato. (...) o desvio de finalidade e o abuso de poder (vícios originados da estrutura subjetiva do agente) são considerados defeitos tipicamente relacionados com a violação à moralidade. Pode-se afirmar, em suma, que a lesão ao princípio da moralidade administrativa é, rigorosamente, uma lesão a valores e princípios incorporados ao ordenamento jurídico, constituindo, portanto, uma injuridicidade, uma ilegalidade lato sensu. Todavia, é uma ilegalidade qualificada pela gravidade do vício que contamina a causa e a finalidade do ato, derivado da ilícita conduta subjetiva do agente. O registro dessas premissas é importante para reafirmar a indispensabilidade da investigação do elemento subjetivo da conduta dos agentes públicos como condição inafastável para caracterizar a violação ao princípio da moralidade administrativa e, com base nele, anular o ato”.

Ao longo do acordão, são citados vários casos onde se entendeu pela legalidade de instituição de pensões a viúva de agentes políticos. A ministra relatora originária era a Ministra Ellen Gracie que em resumo disse ser contra a referida pensão, pois não se pode fazer caridade com os cofres públicos.

Fonte: STF

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