Por maioria de votos
apertada (5 x 4) o STF entendeu que a perda de mandato dos parlamentares que
respondem à ação penal 470 é automática, após o trânsito em julgado da sentença
e não se sujeita à votação legislativa prevista no artigo 55, inciso VI e §
2º, da CF, in verbis: " Art. 55.
Perderá o mandato o Deputado ou Senador: (...) VI - que
sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado. § 2º - Nos casos dos incisos I, II e VI,
a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado
Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva
Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada
ampla defesa.
Ficaram vencidos os
ministros Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Dias Toffoli e Carmen Lúcia,
enquanto acompanharam o voto do relator, Ministro Joaquim Barbosa, os ministros
Celso de Melo, Gilmar Mendes, Luiz Fux e Marco Aurélio.
A tese vencedora é
explicada da seguida forma: O artigo 92 do Código Penal Brasileiro determina
que são também efeitos da condenação a perda de cargo, função pública ou
mandato eletivo: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por
tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou
violação de dever para com a Administração Pública; b) quando for aplicada
pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais
casos. Tais efeitos não são automáticos e precisam ser motivadamente
declarados na sentença, valendo salientar que o artigo 15, inciso III, da
CR/88, expressão prevê que "É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:
(...) III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem
seus efeitos.
Nesse sentido, uma vez que
o intérprete maior da Constituição Federal declarasse os efeitos do artigo 92
do CP, relativos às alíneas a e b do mesmo dispositivo, não poderia
esta decisão ser desconstituída por juízo político, até por que estaria
fulcrada no artigo 15, inciso III da CR/88, de modo que o artigo 55,
inciso VI e § 2º, da CF deveria ser interpretado de forma sistemática,
para abranger por exemplo as condenação por crimes de menor potencial
ofensivo.
Sobre a matéria o Ministro
Marco Aurélio ponderou que são automáticos os efeitos do artigo 15, III,
da CR/88, que deveriam ser motivadamente declarados na decisão judicial, sendo
que tal dispositivo seria uma garantia, pois a normalidade
consubstanciar-se-ia na preservação dos direitos políticos, verificadas
as excepcionalidades taxativas neste artigo, asseverando que que a
drástica consequência da suspensão dos direitos políticos imporia ao julgador
ponderar, diante do caso concreto, se a qualidade do crime praticado ensejaria
este resultado. Também repisou que o primado do Judiciário afastaria a
possibilidade de decisão ficar submetida a condição resolutiva de natureza
política. Aludiu que o artigo. 55 da CF seria reservado a situações concretas
em que não se teria como consequência da condenação, legalmente prevista, a
perda do mandato. Para além da
questão principal, o Ministro Marco Aurélio defendeu que esse
entendimento deveria alcançar não só aqueles com mandato
atualmente, como também os demais que, condenados por crimes contra a
Administração Pública, pudessem buscar mandato ou funções de confiança de
natureza pública como escudo, inclusive suplentes de cargos eletivos, que
ficariam impedidos de assumir o mandato em eventual vacância. Também consignou
que a incidência da reprimenda de interdição temporária de direitos (CP: “Art.
47 - As penas de interdição temporária de direitos são: I - proibição
do exercício de cargo,
função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo”) em relação a
todos os condenados na presente ação pela prática de crimes contra a
Administração Pública.
O Ministro Luiz
Fux asseverou que, com o advento da Lei da “Ficha Limpa”, bastaria
condenação, sem trânsito em julgado, para que o povo considerasse o detentor de
mandato eletivo deslegitimado para praticar atos em nome dos respectivos
eleitores. De acordo com essa concepção, não seria legítimo que os
parlamentares praticassem atos contrários à lei e, ainda assim, mantivessem a
higidez da representatividade popular. Ademais,
não caberia discutir se o Parlamento iria cumprir a decisão da Corte ou não,
mas apenas se o STF deveria declarar a perda do mandato por causa de condenação
criminal, na forma do art. 55 da CF. Frisou que as hipóteses do art. 15 da CF,
de suspensão de direitos políticos, implicariam não só a restrição ao direito
de concorrer ao ius honorum,
mas também restringiriam o ius
sufragii. Consignou
que prevaleceria o cânone constitucional da moralidade administrativa, a
reforçar a impossibilidade de manutenção de mandato após condenação na esfera
penal.
O Ministro Gilmar Mendes
afirmou que os crimes contra a Administração Pública deveriam ter por efeito a
perda da função pública, que seria reconhecida e decretada pelo juiz. Não
haveria ab-rogação do art. 55, VI, da CF, pois não se trataria de crimes de
menor potencial ofensivo, por exemplo. O
aludido inciso continuaria a ser aplicável nos casos em que o título judicial
não impusesse a perda da função. Preconizou
que o exercício de função pública pressuporia liberdade de ir e vir,
incompatível com pena de prisão. Arrematou caber ao Judiciário, como efeito da
condenação, decretar a perda da função ou cargo; e ao Legislativo competiria
eventualmente suspender o processo, no exercício de controle político, conforme
o texto constitucional.
O ministro Celso de
Mello votou no sentido de que todos os condenados por
mais de 4 (quatro) anos de reclusão ou cuja condenação diga respeito a ato de
improbidade administrativa o que ocorre nos crimes contra a administração
pública, tais como peculato e corrupção passiva, deve implicar automaticamente
a perda dos mandados eletivos. E, neste caso, a perda deve ocorre, no
entender do ministro Celso de Mello, mesmo que a pena seja interior a quatro
anos, como no crime de peculato, punido com penas que vão de 2 a 12 anos de
reclusão. Já quanto aos demais casos, isto é, em condenações por tempo
inferior e por delitos de menor potencial ofensivo, caberá à Câmara, no
entendimento do ministro Celso de Mello, deliberar sobre a perda ou não do
mandato, conforme previsto no parágrafo 2º do artigo 55 da Constituição
Federal. O Ministro ponderou que é preciso encontrar uma
harmonização entre disposições antinômicas contidas no texto constitucional,
como no caso dos artigos 15, inciso III (que prevê a perda dos direitos
políticos em caso de condenação criminal transitada em julgado, enquanto
durarem os seus efeitos), e do artigo 55, em seus parágrafos 2º e 3º, que prevê
a interveniência da respectiva Casa Legislativa, em caso de condenação criminal
de seus membros. Para
harmonizar esse conflito, o ministro Celso de Mello se filiou à tese defendida
pelo ministro Gilmar Mendes, no sentido de considerar a Constituição como um
todo e, fiel às técnicas interpretativas adotadas pelo STF para superar
antinomias existentes na CF, prestigiar valores que se expressam nas ideias da
ética pública e da moralidade administrativa, preservando, assim, a integridade
de valores de fundamental importância, como os postulados da isonomia, forma
republicana de governo, moralidade pública e da probidade. Por fim, advertiu em
respeito à força normativa da Constituição o Poder Legislativo deveria se curvar à sentença do STF, a quem
cabe por expressa delegação do constituinte, de ter o monopólio da última
palavra da interpretação da Constituição Federal e que uma decisão
desfavorável não pode ser tida como violação do princípio da separação dos
poderes, não podendo o Legislativo invocar monopólio de interpretações
constitucionais, ajustadas a uma visão de conveniência e que o
descumprimento de decisão a Suprema Corte conduz à responsabilização por
improbidade administrativa, nos termos do parágrafo 4º do artigo 37 da
Constituição Federal e pelo crime de prevaricação, previsto no artigo. 319 do
Código Penal.
A tese vencida pondera
que a possibilidade de perda automática do
mandato parlamentar em decorrência de condenação judicial sofrida pelo
respectivo titular seria tema extremamente sensível para o equilíbrio dos
Poderes e que negar a plena eficácia do art. 55, § 2º, da CF implicaria a
anulação, pelo Poder Judiciário, dos votos recebidos pelo mandatário que
posteriormente fora condenado, numa afronta aos princípio da separação dos
poderes.
A Ministra Rosa Weber assinalou que que o
juiz competente para julgar sobre o exercício do poder político, do poder de
representação, seria o povo soberano, que o faria diretamente
no caso de democracias, cujas Constituições previssem o instituto do recall, ou por meio de seus
representantes na hipótese no art. 55, VI, § 2º, da CF e que a melhor exegese
seria aquela que não atribuísse ao art. 92 do CP a tarefa de vetor
interpretativo a partir do qual se deduziria o sentido dos artigos 15, III, e
55, IV e VI, da CF. Portanto, o sentido da norma constitucional haveria
de ser extraído, primordialmente, dela mesma, tomada como sistema, e não da
legislação infraconstitucional que a ela se submeteria. Avaliou, também, que a
condenação criminal transitada em julgado estaria contida no art.15, III, da CF entre as causas de suspensão
dos direitos políticos, já que se estenderia enquanto durassem os
efeitos da condenação e que para a perda, para o procedimento para a
cassação de mandatos de deputados e senadores, imprescindível a dicção
do artigo 55, § 2º, da CR/88. A destituição de mandato de
deputado ou senador, portanto, no caso de condenação criminal transitada em
julgado, revestir-se-ia de contornos políticos e, sendo o mandato instituto de
representação política dos governados, somente àqueles teria sido conferida a
legitimidade para se pronunciar pela sua revogação.
Os Ministros Dias Toffoli
e Cármen Lúcia também seguiram o Revisor. O Min. Dias Toffoli aduziu que a
aparente antinomia entre os artigos 15, III, e 55 da CF seria resolvida pelo critério
da especialidade. Assim, os
parlamentares estariam excluídos da abrangência do art. 15, III, da CF, por
lhes ser aplicável, especificamente, o seu art. 55.
Fonte: STF
Nenhum comentário:
Postar um comentário