terça-feira, 15 de janeiro de 2013

STJ – Venda Casada – Reportagem especial – 13.01.2013


A venda casada é considera pelo CDC prática abusiva e é caracterizada pela presença de duas diferentes formas de condicionamento. Ou por vincular a venda de bem ou serviço à compra de outros itens ou pela imposição de quantidade mínima de produto a ser comprado.

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

A prática de venda casada se caracteriza quando uma empresa usa do poder econômico ou técnico para obstar a liberdade de escolha do consumidor, especialmente no direito que tem de obter produtos e serviços de qualidade satisfatória e a preços competitivos.

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Em 2008, a Terceira Turma do Tribunal considerou que o mutuário não está obrigado a adquirir o seguro habitacional da mesma entidade que financie o imóvel ou por seguradora por ela indicada, mesmo que o seguro habitacional seja obrigado por lei no Sistema Financeiro de Habitação. A obrigação de aquisição do seguro no mesmo agente que financia o imóvel caracteriza venda casada, uma prática considerada ilegal (Resp 804.202).

Merece citação a ementa do Resp 804.202:

“SFH. SEGURO HABITACIONAL. CONTRATAÇÃO FRENTE AO PRÓPRIO MUTUANTE  OU  SEGURADORA  POR  ELE  INDICADA. DESNECESSIDADE.  INEXISTÊNCIA  DE  PREVISÃO  LEGAL.  VENDA CASADA.
-  Discute-se  neste  processo  se,  na  celebração  de  contrato  de  mútuo  para aquisição  de  moradia,  o  mutuário  está  obrigado  a  contratar  o  seguro habitacional  diretamente  com  o  agente  financeiro  ou  com  seguradora  por  este indicada,  ou se  lhe  é  facultado  buscar  no  mercado  a  cobertura  que  melhor  lhe aprouver.
-  O  seguro  habitacional  foi  um  dos  meios  encontrados  pelo  legislador  para garantir  as  operações  originárias  do  SFH,  visando  a  atender  a  política habitacional  e a incentivar  a aquisição  da casa própria.  A apólice  colabora  para com  a viabilização  dos  empréstimos,  reduzindo  os riscos  inerentes  ao repasse  de recursos  aos mutuários.
-  Diante  dessa  exigência  da  lei,  tornou-se  habitual  que,  na  celebração  do contrato  de financiamento  habitacional,  as instituições  financeiras  imponham  ao mutuário  um seguro  administrado  por  elas  próprias  ou por  empresa  pertencente ao seu grupo  econômico.
- A despeito  da aquisição  do seguro ser fator  determinante  para  o financiamento habitacional,  a  lei  não  determina  que  a  apólice  deva  ser  necessariamente contratada  frente ao próprio  mutuante  ou seguradora  por ele indicada.
-  Ademais,  tal  procedimento  caracteriza  a  denominada  “venda  casada”, expressamente  vedada  pelo  art.  39,  I,  do  CDC,  que  condena  qualquer  tentativa do  fornecedor  de se  beneficiar  de sua superioridade  econômica  ou  técnica  para estipular  condições  negociais  desfavoráveis  ao  consumidor,  cerceando-lhe  a liberdade  de escolha.
Recurso especial não conhecido”.

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 É venda casada também condicionar a concessão de cartões de crédito à contratação de seguros e títulos de capitalização.

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O STJ decidiu, em julgado de 2007, que os frequentadores de cinema não estão obrigados a consumir unicamente os produtos da empresa vendidos na entrada das salas. A empresa foi multada por praticar a “venda casada”, ao permitir que somente produtos adquiridos em suas dependências fossem consumidos nas salas de projeção (Resp 744.602).

Vejam-se os trechos mais importantes da ementa deste julgado:

1. A intervenção do Estado na ordem econômica, fundada na livre  iniciativa,  deve  observar  os  princípios  do  direito  do consumidor,  objeto  de  tutela  constitucional  fundamental especial (CF, arts. 170 e 5º, XXXII).
2. Nesse  contexto,  consagrou-se  ao  consumidor  no  seu ordenamento  primeiro  a  saber:  o  Código  de  Defesa  do Consumidor  Brasileiro,  dentre  os  seus  direitos  básicos  "a educação  e  divulgação  sobre  o  consumo  adequado  dos produtos  e serviços, asseguradas  a liberdade  de  escolha e a igualdade  nas contratações"  (art. 6º, II, do CDC).
3. A denominada 'venda casada', sob esse enfoque, tem como ratio  essendi da vedação a proibição imposta ao fornecedor de,  utilizando  de  sua  superioridade  econômica  ou  técnica, opor-se  à  liberdade  de  escolha  do  consumidor  entre  os produtos  e  serviços  de  qualidade  satisfatório  e  preços competitivos.
4. Ao fornecedor de produtos ou serviços, consectariamente, não  é  lícito,  dentre  outras  práticas  abusivas,  condicionar  o fornecimento  de  produto  ou  de serviço  ao fornecimento  de outro produto ou serviço (art. 39,I do CDC).
5. A  prática  abusiva  revela-se  patente  se  a  empresa cinematográfica permite a entrada de produtos adquiridos na suas  dependências  e  interdita  o  adquirido  alhures, engendrando por via oblíqua a cognominada 'venda casada', interdição  inextensível  ao  estabelecimento  cuja  venda  de produtos  alimentícios  constituiu  a essência da sua atividade comercial como, verbi gratia, os bares e restaurantes.

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O Código do Consumidor brasileiro não proíbe o fornecedor de oferecer promoções, vantagens aos clientes que queiram adquirir mais de um produto. Mas proíbe expressamente condicionar a venda de um produto a outro.           
O STJ considerou abusiva a venda a prazo de gasolina por posto, desde que o cliente adquirisse um refrigerante. Para o posto, o refrigerante faria parte de um pacote promocional. Mas, de acordo com os ministros do STH, a prática abusiva se configurou pela falta de pertinência, ou necessidade natural na venda conjunta dos produtos “gasolina” e “refrigerante”. Embora o fornecedor tenha direito de decidir se o pagamento será a vista ou a prazo, não pode condicionar a venda de um produto a outro, como forma de suposto benefício (Resp 384.284).

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O STJ tem decisões no sentido de que uma vez comercializado pacote turístico, nele incluindo transporte aéreo por meio de vôo fretado, a agência de turismo responde pela má prestação do serviço (Resp 783.016). Outra decisão garante que agência de viagens responda por danos pessoais ocasionados pelo mau serviço prestado em rede hoteleira, quando contratados em pacote turístico (Resp 287.849).

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Ao analisar um processo sobre arrendamento mercantil em que impuseram ao consumidor a responsabilidade de pagar o seguro de um contrato de leasing, o STJ decidiu que a prática não era abusiva. O seguro, no entanto, poderia ser feito em seguradora de livre escolha do interessado, sob o risco de ferir o direito de escolha do consumidor. (Resp 1.060.515).
Vale mencionar os principais trechos da ementa deste julgado:
1.  Não se  pode  interpretar  o  Código  de  Defesa  do Consumidor  de  modo  a  tornar  qualquer  encargo  contratual atribuído ao consumidor como abusivo, sem observar que as relações contratuais se estabelecem, igualmente, através de regras de direito civil.
2. O CDC não exclui a principiologia dos contratos de direito  civil.  Entre  as  normas  consumeristas  e  as  regras gerais  dos  contratos,  insertas  no  Código  Civil  e  legislação extravagante, deve  haver  complementação e não exclusão. É o que a doutrina chama de Diálogo das Fontes.
3.  Ante  a  natureza  do  contrato  de  arrendamento mercantil  ou  leasing,  em  que  pese  a  empresa  arrendante figurar  como  proprietária  do  bem,  o  arrendatário  possui  o dever  de  conservar  o  bem  arrendado,  para que ao final da avença,  exercendo  o  seu  direito,  prorrogue  o  contrato, compre ou devolva o bem.
4.  A  cláusula  que  obriga  o  arrendatário  a  contratar seguro em nome da arrendante não é abusiva, pois aquele possui  dever  de  conservação  do  bem,  usufruindo  da  coisa como  se  dono  fosse,  suportando,  em razão  disso, riscos  e encargos  inerentes  a  sua  obrigação.  O  seguro,  nessas circunstâncias,  é  garantia  para  o  cumprimento  da  avença, protegendo  o  patrimônio  do  arrendante,  bem  como  o indivíduo de infortúnios.
5.  Rejeita-se,  contudo,  a  venda  casada,  podendo  o seguro  ser  realizado  em  qualquer  seguradora  de  livre escolha do interessado.

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A segunda hipótese prevista pelo artigo 39 inciso I, que regulamenta venda casada no CDC, é aquela que o fornecedor exige que se adquira uma quantidade mínima do produto. É o típico caso em que o fornecedor garante a venda “se” e “somente se” o consumidor adquirir certa quantidade do produto.

Em 2011, o STJ pacificou o entendimento de que nos condomínios em que o total de água consumida é medido por um único hidrômetro, é ilegal a cobrança do valor do consumo mínimo multiplicado pelo número de unidades residências (Resp 1.166.561).

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. FORNECIMENTO DE ÁGUA. TARIFA MÍNIMA MULTIPLICADA PELO NÚMERO DE UNIDADES AUTÔNOMAS (ECONOMIAS). EXISTÊNCIA DE ÚNICO HIDRÔMETRO NO CONDOMÍNIO.
1. A cobrança pelo fornecimento de água aos condomínios em que o consumo total de água é medido por único hidrômetro deve se dar pelo consumo real aferido.
2. O Superior Tribunal de Justiça firmou já entendimento de não ser lícita a cobrança de tarifa de água no valor do consumo mínimo multiplicado pelo número de economias existentes no imóvel, quando houver único hidrômetro no local.
3. Recurso especial improvido. Acórdão sujeito ao procedimento do artigo 543-C do Código de Processo Civil.
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Fonte: STJ

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