A venda casada é considera
pelo CDC prática abusiva e é caracterizada pela presença de duas diferentes
formas de condicionamento. Ou por vincular a venda de bem ou serviço à compra
de outros itens ou pela imposição de quantidade mínima de produto a ser
comprado.
Art. 39. É vedado ao
fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: I -
condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro
produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;
A prática de venda casada se
caracteriza quando uma empresa usa do poder econômico ou técnico para obstar a
liberdade de escolha do consumidor, especialmente no direito que tem de obter
produtos e serviços de qualidade satisfatória e a preços competitivos.
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Em 2008, a Terceira Turma do
Tribunal considerou que o
mutuário não está obrigado a adquirir o seguro habitacional da mesma entidade
que financie o imóvel ou por seguradora por ela indicada, mesmo que o seguro habitacional seja obrigado por lei no Sistema Financeiro
de Habitação. A obrigação de aquisição do seguro no mesmo agente que
financia o imóvel caracteriza
venda casada, uma prática considerada ilegal (Resp 804.202).
Merece
citação a ementa do Resp 804.202:
“SFH. SEGURO HABITACIONAL.
CONTRATAÇÃO FRENTE AO PRÓPRIO MUTUANTE
OU SEGURADORA POR
ELE INDICADA. DESNECESSIDADE. INEXISTÊNCIA
DE PREVISÃO LEGAL.
VENDA CASADA.
- Discute-se
neste processo se, na celebração de
contrato de mútuo
para aquisição de moradia,
o mutuário está
obrigado a contratar
o seguro habitacional diretamente
com o agente
financeiro ou com
seguradora por este indicada, ou se lhe é
facultado buscar no
mercado a cobertura
que melhor lhe aprouver.
- O seguro
habitacional foi um
dos meios encontrados
pelo legislador para garantir
as operações originárias
do SFH, visando
a atender a
política habitacional e a
incentivar a aquisição da casa própria. A apólice
colabora para com a viabilização dos
empréstimos, reduzindo os riscos
inerentes ao repasse de recursos
aos mutuários.
- Diante
dessa exigência da
lei, tornou-se habitual
que, na celebração
do contrato de financiamento habitacional,
as instituições financeiras imponham
ao mutuário um seguro administrado
por elas próprias
ou por empresa pertencente ao seu grupo econômico.
- A despeito da aquisição do seguro ser fator determinante
para o financiamento habitacional, a
lei não determina
que a apólice
deva ser necessariamente contratada frente ao próprio mutuante
ou seguradora por ele indicada.
- Ademais, tal
procedimento caracteriza a
denominada “venda casada”, expressamente vedada
pelo art. 39, I, do
CDC, que condena qualquer
tentativa do fornecedor de se
beneficiar de sua superioridade econômica
ou técnica para estipular condições
negociais desfavoráveis ao consumidor,
cerceando-lhe a liberdade de escolha.
Recurso especial não
conhecido”.
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É venda casada também condicionar a
concessão de cartões de crédito à contratação de seguros e títulos de
capitalização.
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O STJ decidiu, em julgado de
2007, que os frequentadores de cinema não estão obrigados a consumir unicamente
os produtos da empresa vendidos na entrada das salas. A empresa foi multada por
praticar a “venda casada”, ao permitir que somente produtos adquiridos em suas
dependências fossem consumidos nas salas de projeção (Resp 744.602).
Vejam-se os trechos mais
importantes da ementa deste julgado:
1. A intervenção do Estado
na ordem econômica, fundada na livre
iniciativa, deve observar
os princípios do
direito do consumidor, objeto
de tutela constitucional fundamental especial (CF, arts. 170 e 5º,
XXXII).
2. Nesse contexto,
consagrou-se ao consumidor
no seu ordenamento primeiro
a saber: o
Código de Defesa
do Consumidor Brasileiro, dentre
os seus direitos
básicos "a educação e
divulgação sobre o
consumo adequado dos produtos
e serviços, asseguradas a liberdade
de escolha e a igualdade nas contratações" (art. 6º, II, do CDC).
3. A denominada 'venda
casada', sob esse enfoque, tem como ratio
essendi da vedação a proibição imposta ao fornecedor de, utilizando
de sua superioridade
econômica ou técnica, opor-se à
liberdade de escolha
do consumidor entre
os produtos e serviços
de qualidade satisfatório
e preços competitivos.
4. Ao fornecedor de produtos
ou serviços, consectariamente, não
é lícito, dentre
outras práticas abusivas,
condicionar o fornecimento de
produto ou de serviço
ao fornecimento de outro produto
ou serviço (art. 39,I do CDC).
5. A prática abusiva
revela-se patente se
a empresa cinematográfica permite
a entrada de produtos adquiridos na suas
dependências e interdita
o adquirido alhures, engendrando por via oblíqua a
cognominada 'venda casada', interdição
inextensível ao estabelecimento cuja
venda de produtos alimentícios
constituiu a essência da sua
atividade comercial como, verbi gratia, os bares e restaurantes.
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O Código do Consumidor
brasileiro não proíbe o fornecedor de oferecer promoções, vantagens aos
clientes que queiram adquirir mais de um produto. Mas proíbe expressamente
condicionar a venda de um produto a outro.
O STJ considerou abusiva a
venda a prazo de gasolina por posto, desde que o cliente adquirisse um
refrigerante. Para o posto, o refrigerante faria parte de um pacote
promocional. Mas, de acordo com os ministros do STH, a prática abusiva se configurou pela falta de
pertinência, ou necessidade natural na venda conjunta dos produtos “gasolina” e
“refrigerante”. Embora o fornecedor tenha direito de decidir se o
pagamento será a vista ou a prazo, não pode condicionar a venda de um produto a outro, como forma de
suposto benefício (Resp 384.284).
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O STJ tem decisões no
sentido de que uma vez comercializado pacote turístico, nele incluindo
transporte aéreo por meio de vôo fretado, a agência de turismo responde pela má
prestação do serviço (Resp 783.016). Outra decisão garante que agência de
viagens responda por danos pessoais ocasionados pelo mau serviço prestado em
rede hoteleira, quando contratados em pacote turístico (Resp 287.849).
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Ao analisar um processo
sobre arrendamento mercantil em que impuseram ao consumidor a responsabilidade
de pagar o seguro de um contrato de leasing, o STJ decidiu que a prática não
era abusiva. O seguro, no
entanto, poderia ser feito em seguradora de livre escolha do interessado, sob o
risco de ferir o direito de escolha do consumidor. (Resp 1.060.515).
Vale mencionar os principais
trechos da ementa deste julgado:
1. Não se pode
interpretar o Código
de Defesa do Consumidor
de modo a
tornar qualquer encargo
contratual atribuído ao consumidor como abusivo, sem observar que as relações
contratuais se estabelecem, igualmente, através de regras de direito civil.
2. O CDC não exclui a principiologia dos contratos de direito civil.
Entre as normas
consumeristas e as
regras gerais dos contratos,
insertas no Código
Civil e legislação extravagante, deve haver
complementação e não exclusão. É o que a doutrina chama de Diálogo das
Fontes.
3. Ante
a natureza do
contrato de arrendamento mercantil ou
leasing, em que
pese a empresa
arrendante figurar como proprietária
do bem, o
arrendatário possui o dever
de conservar o
bem arrendado, para que ao final da avença, exercendo
o seu direito,
prorrogue o contrato, compre ou devolva o bem.
4. A cláusula
que obriga o
arrendatário a contratar seguro em nome da arrendante não é
abusiva, pois aquele possui dever de
conservação do bem,
usufruindo da coisa como
se dono fosse,
suportando, em razão disso, riscos
e encargos inerentes a
sua obrigação. O
seguro, nessas circunstâncias, é
garantia para o
cumprimento da avença, protegendo o
patrimônio do arrendante,
bem como o indivíduo de infortúnios.
5. Rejeita-se, contudo,
a venda casada,
podendo o seguro ser
realizado em qualquer
seguradora de livre escolha do interessado.
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A segunda hipótese prevista
pelo artigo 39 inciso I, que regulamenta venda casada no CDC, é aquela que o
fornecedor exige que se adquira uma quantidade mínima do produto. É o típico
caso em que o fornecedor garante a venda “se” e “somente se” o consumidor
adquirir certa quantidade do produto.
Em 2011, o STJ pacificou o entendimento de que nos condomínios em que o
total de água consumida é medido por um único hidrômetro, é ilegal a cobrança
do valor do consumo mínimo multiplicado pelo número de unidades residências
(Resp 1.166.561).
RECURSO ESPECIAL
REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. FORNECIMENTO DE ÁGUA. TARIFA MÍNIMA
MULTIPLICADA PELO NÚMERO DE UNIDADES AUTÔNOMAS (ECONOMIAS). EXISTÊNCIA DE ÚNICO
HIDRÔMETRO NO CONDOMÍNIO.
1. A cobrança pelo
fornecimento de água aos condomínios em que o consumo total de água é medido
por único hidrômetro deve se dar pelo consumo real aferido.
2. O Superior Tribunal de
Justiça firmou já entendimento de não ser lícita a cobrança de tarifa de água
no valor do consumo mínimo multiplicado pelo número de economias existentes no
imóvel, quando houver único hidrômetro no local.
3. Recurso especial
improvido. Acórdão sujeito ao procedimento do artigo 543-C do Código de
Processo Civil.
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Fonte: STJ
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