Dosimetria no crime de roubo majorado.
1. O habeas corpus tem uma rica história,
constituindo garantia fundamental do cidadão. Ação constitucional que é, não pode ser o writ
amesquinhado, mas também não é passível de vulgarização, sob pena de restar
descaracterizado como remédio heroico. Contra a denegação de habeas corpus por Tribunal Superior prevê a Constituição
Federal remédio jurídico expresso, o
recurso ordinário. Diante da dicção do art. 102, II, a, da
Constituição da República, a impetração de novo habeas corpus em caráter
substitutivo escamoteia o instituto recursal próprio, em manifesta burla do
preceito constitucional.
2.
Cabe às instâncias inferiores decidir sobre a fração pertinente de
aumento da pena decorrente das qualificadoras do § 2º do art. 157 do Código
Penal, não se mostrando hábil o habeas corpus para revisão, salvo se presente
manifesta ilegalidade ou arbitrariedade. Configura flagrante ilegalidade a exasperação da pena,
pela presença de causas de aumento
relativas ao crime de roubo, em 3/5, patamar superior ao máximo previsto em lei
(art. 157, § 2º, do Código Penal).
3. A concorrência de mais de uma
qualificadora não autoriza que seja ultrapassado o limite legal.
4. Habeas
corpus extinto sem resolução do mérito pela inadequação da via eleita, mas com
concessão de ofício para limitar a exasperação da pena cominada ao crime de
roubo ao patamar máximo, acréscimo de metade, estabelecido pelo § 2º do art.
157 do Código Penal.
Ordem estendida de ofício aos demais condenados.
Roubo
Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para
outrem, mediante grave ameaça ou violência à pessoa, ou depois de havê-la, por
qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
§ 1º - Na mesma
pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra
pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção
da coisa para si ou para terceiro.
§ 2º - A pena aumenta-se de um terço até
metade:
I - se a
violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;
II - se há o
concurso de duas ou mais pessoas;
III - se a vítima está em serviço de transporte de
valores e o agente conhece tal circunstância.
IV - se a subtração for de veículo automotor que venha
a ser transportado para outro Estado ou para o exterior;
V - se o agente
mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade.
§ 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a
pena é de reclusão, de sete a quinze anos, além da multa; se resulta morte, a
reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa.
No caso concreto, o roubo foi majorado pela
presença de três causas de aumento de pena previstas nos incisos I, II e V do §2◦
do artigo 157, pois dois agentes, em concurso de pessoas (II), mediante grave
ameaça com o emprego de arma de fogo (I), violência e restrição da liberdade
das vítimas (V), subtraíram diversos bens que guarneciam a casa da vítima, R$
300,00 (trezentos reais) em espécie e, ainda, um veículo Nissan Frontier, placa
CYU 9005.
O juiz de 1ª instância fixou a pena em 06 (seis) anos, 04 (quatro)
meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão, no regime inicial
semiaberto, e de 16 (dezesseis) dias-multa, pela prática do crime previsto no
artigo 157, § 2º, incisos I, II e V, do Código Penal. Ou seja, considerando que
a pena mínima para o delito de roubo é quatro anos, ela foi majorada em 02 anos, 04 meses e 24 dias (3/5 de 4
anos).
Indaga-se, considerando a presença dessas três
majorantes, se é justa a majoração da pena neste patamar (02 anos, 04 meses e 24 dias
(3/5 de 4 anos), uma vez que a pena pode ser majorada de um terço (1 ano, 3
meses e 18 dias) até a metade da pena base já fixada (2 anos)?
O juiz de primeiro grau fez a dosimetria
nesses modos:
RÉU ZWINGLIO SORZAN GONÇALVES FEIJÓ
Na primeira fase da dosimetria penal, passo a analisar
as circunstâncias judiciais do artigo
59 do Código
Penal: culpabilidade (dolo inerente
ao tipo, sem
considerações que possam aumentar
significativamente a reprovabilidade da conduta);
antecedentes (o acusado
é tecnicamente primário); conduta social
(nada a considerar);
personalidade (nada a considerar); motivos
do crime (inerentes
à espécie –
crime contra o patrimônio); circunstâncias do crime (inerentes ao tipo penal); consequências
do crime (inerentes
à espécie); comportamento da
vítima (nada a considerar).
Assim, fixo a pena
base no mínimo legal, qual seja, 04(quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias
multa.
Art. 49 - A pena de multa consiste no pagamento ao
fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa.
Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no
máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. (Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984)
§ 1º - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do
maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco)
vezes esse salário. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 2º - O valor da multa será atualizado, quando da
execução, pelos índices de correção monetária. (Redação dada pela Lei nº 7.209,
de 11.7.1984)
Na segunda fase de aplicação de pena, não há atenuantes
e agravantes a serem consideradas.
Na terceira fase da dosimetria penal, malgrado a
ausência de causas de diminuição, observo a presença de três causas de aumento
de pena descritas na parte especial do Código Penal, ou seja, no artigo 157, §
2º, incisos I, II e V, do Código Penal, motivo pelo qual majoro a pena do
acusado de 3/5, totalizando 06 (seis) anos, 04 (quatro) meses e 24 (vinte e
quatro) dias de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa.
Baseado no critério da situação econômica do réu,
arbitro cada dia multa no
valor de 1/30
(um trigésimo) do
salário mínimo vigente à data dos fatos.
Fixo o regime semi-aberto para o início de cumprimento de
pena, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea ‘b’, do Código Penal”.
Para o
STF, o acréscimo de 3/5 (02 anos, 04 meses e 24 dias - 3/5 de 4 anos) fora
excessivo, revendo a dosimetria da pena de ofício.
A dosimetria
da pena é
matéria sujeita a
certa discricionariedade judicial. O Código Penal e as leis
extravagantes não estabelecem
rígidos esquemas matemáticos
ou regras absolutamente objetivas para tanto. Cabe às
instâncias ordinárias, mais próximas dos fatos e das provas, fixar as penas. Às
Cortes Superiores, no exame da dosimetria das penas em grau recursal, compete o
controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, bem
como a correção de eventuais discrepâncias, se
gritantes e arbitrárias,
nas frações de aumento ou diminuição adotadas pelas
instâncias inferiores.
No
caso, após comprovadas
as causas de
aumento de pena,
o magistrado exasperou a reprimenda, valendo-se, ao que tudo indica, do critério da quantidade de
causas presentes para atribuir o aumento mais próximo da menor ou da
maior fração legal, concretizando a exasperação na fração de 3/5.
O
aumento da pena
deve ser realizado
com estrita observância à
variação de um terço até metade, estabelecida no art. 157, § 2º, do
Código Penal, sendo
certo que, independentemente do
critério escolhido pelo julgador,
o limite máximo
da exasperação será
de até metade.
A
concorrência de mais de uma qualificadora não autoriza que seja ultrapassado o
limite legal.
Com efeito, considerando-se a exasperação
máxima (metade de 04 anos, isto é, 02 anos), o réu somente poderia ser
condenado no máximo a 06 (seis) anos de reclusão e para este patamar é que o
STF readequou a pena do réu:
“Afigura-se ilegal a dosimetria realizada pelo
magistrado, pois a exasperação da pena, fixada em 3/5, superou o patamar máximo
previsto em lei. Diante da apontada ilegalidade,
concedo a ordem
de ofício para limitar a
exasperação da pena à metade, nos termos do § 2º do art. 157 do Código Penal,
reduzindo a pena
cominada ao roubo
praticado pelo paciente para
seis anos de reclusão
e quinze dias multa”.
Fonte: STF
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