Porte
de arma de fogo de uso permitido com numeração raspada.
É firme a jurisprudência deste Supremo
Tribunal no sentido de que a Medida Provisória n. 417, que deu nova redação ao
art. 30 da Lei n. 10.826/2003, promoveu a prorrogação do prazo para o dia 31 de
dezembro de 2008 para os
possuidores de arma de fogo de uso permitido ainda não registrada, não
abarcando, por conseguinte, a conduta de possuir arma de fogo de uso proibido
ou restrito ou com numeração raspada.
Art. 30. Os
possuidores e proprietários de arma de
fogo de uso permitido ainda não registrada deverão solicitar seu registro
até o dia 31 de dezembro de 2008, mediante apresentação de documento de identificação
pessoal e comprovante de residência fixa, acompanhados de nota fiscal de compra
ou comprovação da origem lícita da posse, pelos meios de prova admitidos em
direito, ou declaração firmada na qual constem as características da arma e a
sua condição de proprietário, ficando este dispensado do pagamento de taxas e do
cumprimento das demais exigências constantes dos incisos I a III do caput do
art. 4o desta Lei.
Parágrafo único.
Para fins do cumprimento do disposto no caput deste artigo, o
proprietário de arma de fogo poderá obter, no Departamento de Polícia Federal,
certificado de registro provisório, expedido na forma do § 4o do art. 5o desta
Lei”; e
“Art. 32. Os possuidores e proprietários de arma de fogo
poderão entregá-la, espontaneamente, mediante recibo, e, presumindo-se de boa-fé, serão indenizados, na forma do
regulamento, ficando extinta a punibilidade de eventual posse irregular da
referida arma.”
Além da tipicidade do crime de porte ilegal
de arma de uso restrito com numeração raspada ter se configurado na espécie, a
causa extintiva de punibilidade temporária sequer alcançaria a conduta do autor,
pois ela ocorreu em junho de 2009, fora do período de abrangência da vacatio legis definida em lei.
Cumpre mencionar que os delitos de posse ou
porte de arma de fogo de uso permitido não se confundem com os delitos de posse
ou porte de arma de fogo de uso permitido com
numeração raspada. São tipos penais diferentes, sendo que os últimos são
dignos de maior reprimenda penal, em face na maior dificuldade do seu controle,
pelo favorecimento da criminalidade organizada, e para coibir o comércio de
ilegal de armas.
Posse irregular de
arma de fogo de uso permitido
Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo,
acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou
regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no
seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do
estabelecimento ou empresa: Pena – detenção, de um (um) a três (três) anos, e
multa.
Porte ilegal de arma
de fogo de uso permitido
Art. 14. Portar,
deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda
que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar
arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em
desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 2 (dois)
a 4 (quatro) anos, e multa.
Posse ou porte
ilegal de arma de fogo de uso restrito
Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer,
receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente,
emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo,
acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em
desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 3 (três)
a 6 (seis) anos, e multa.
Parágrafo único. Nas
mesmas penas incorre quem:
I – suprimir ou
alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação
de arma de fogo ou artefato;
O fato
de armas apreendidas estarem com suas numerações raspadas afasta a presunção
relativa de boa-fé do autor exigida para concessão do prazo legal para entrega,
não comprovada por qualquer outro meio nos autos. Vale observar, que pela leitura do
acórdão do STF, o autor também foi flagrado na posse de 69 (sessenta e nove)
munições dos calibres 38,44 e 32. O autor alegou que o material pertencia ao
seu falecido pai.
Outros
precedentes:
“1. Abolitio criminis temporária. 2. Posse de arma de
fogo com numeração raspada. 3. Vacatio legis da Lei n. 10.826/2003. Inaplicabilidade.
4. A Medida Provisória 417, que deu nova redação ao art. 30 da Lei 10.826/2003,
promoveu a prorrogação do prazo para o dia 31 de dezembro de 2008 para os
possuidores de arma de fogo de uso permitido ainda não registrada, não
abarcando, por conseguinte, a conduta de possuir arma de fogo de uso proibido
ou restrito ou com numeração raspada. 5. Ordem denegada” (HC 110.301, Rel. Min.
Gilmar Mendes, DJ 29.3.2012)”
“A vacatio legis de 180 dias prevista nos artigos 30 a
32 da Lei 10.826 não tornou atípica a conduta do porte ilegal de arma por
pessoa não autorizada ou com numeração raspada. II - Precedentes: HC 94158/MG,
Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, HC 90.995/SP, Rel. Min. Menezes
Direito e RHC 86886/DF, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, dentre outros. III - Ordem
denegada.” (HC 94.241, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 29.5.2009).
Por fim, cabe uma indagação: Quantos crimes
comete aquele que adquire uma arma de fogo ilegalmente? Se o agente sabe da
origem ilícita da arma de fogo deve responder por receptação e posse ou porte
de arma de fogo. Nesse sentido, a jurisprudência do STJ:
REsp 1133986 / RS - RECURSO ESPECIAL - 2009/0133788-0 -
Relator(a)
Ministro JORGE MUSSI (1138) - Órgão Julgador - T5 -
QUINTA TURMA Data do Julgamento - 04/05/2010 - Data da Publicação/Fonte - DJe
31/05/2010
RECURSO ESPECIAL. PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA E
RECEPTAÇÃO DOLOSA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. NÃO APLICAÇÃO. CONCURSO MATERIAL.
1. Quem adquire arma de fogo, cuja origem sabe ser
criminosa, responde por delito contra o patrimônio, no momento em que se apodera
da res.
2. Posteriormente, se vier a ser flagrado portando a
arma, estará incorrendo na infração penal tipificada no art. 14 do Estatuto do Desarmamento
(no qual se protege a incolumidade pública).
3. Portanto, tendo em vista que os crimes em questão
possuem objetividade jurídica diversa e momentos consumativos diferentes, não
há que se falar em consunção.
4. Recurso conhecido e provido para condenar o réu
quanto ao delito previsto no art. 180, caput, do Código Penal, em concurso
material com o tipificado no art. 14 da Lei n.º 10.826/2003, determinando-se o
retorno dos autos à origem para a prolação de nova sentença.
AgRg no REsp 908826 / RS - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO
ESPECIAL - 2006/0265522-6 - Relator(a) Ministra JANE SILVA (DESEMBARGADORA
CONVOCADA DO TJ/MG) (8145) - Órgão Julgador
T6 - SEXTA TURMA - Data do Julgamento 30/10/2008 Data
da Publicação/Fonte DJe 17/11/2008
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. PORTE
ILEGAL DE ARMA E RECEPTAÇÃO DOLOSA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUTONOMIA
DE CONDUTAS. CONCURSO MATERIAL. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A jurisprudência desta Corte admite a revaloração da
prova ou de dados explicitamente admitidos e delineados no decisório recorrido,
não se caracterizando o vedado reexame do material de conhecimento.
2. Caso o agente adquira a arma sabendo ser ela fruto
de um delito, estará cometendo um crime contra o patrimônio no momento em que
se apoderar da res. Se depois mantiver consigo a arma, circulando com a mesma
ou mantendo-a guardada, estará cometendo o delito de porte ou posse ilegal (os
quais possuem uma objetividade jurídica diversa e momentos consumativos
ulteriores).
3. Na receptação, sabe-se que o dolo, consistente na
prévia ciência da origem ilícita do bem, é de difícil comprovação, porque
estágio meramente subjetivo do comportamento, devendo ser apurado das demais circunstâncias
que cercam o fato e da própria conduta do agente. No caso, ambos estão a
evidenciar a prévia ciência da origem criminosa por parte do recorrido. Se a numeração estava raspada quando da apreensão
da arma, ou o acusado já recebeu o revólver nesse estado, o que permitiria
afirmar que tinha ciência da sua origem ilícita, pois é certo que quem recebe
arma com numeração raspada tem ciência da sua origem ilícita, ou o próprio
acusado raspou a numeração, o que faz com que também se possa afirmar que
conhecia a origem ilícita do revólver quando recebeu, tanto que queria apagar a
numeração original, para evitar futura identificação da arma.
4. Agravo a que se nega provimento.
Fonte: STF e STJ
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