quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Informativo 693 STF - HC N. 110.298-SP – ABOLITIO CRIMINIS E PORTE DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO COM NUMERAÇÃO RASPADA. NÃO APLICAÇÃO - MINISTRO RELATOR: MIN. CÁRMEN LÚCIA -1ª TURMA. 18.02.2012



Porte de arma de fogo de uso permitido com numeração raspada.



É firme a jurisprudência deste Supremo Tribunal no sentido de que a Medida Provisória n. 417, que deu nova redação ao art. 30 da Lei n. 10.826/2003, promoveu a prorrogação do prazo para o dia 31 de dezembro de 2008 para os possuidores de arma de fogo de uso permitido ainda não registrada, não abarcando, por conseguinte, a conduta de possuir arma de fogo de uso proibido ou restrito ou com numeração raspada.

Art. 30.  Os possuidores e proprietários de arma de fogo de uso permitido ainda não registrada deverão solicitar seu registro até o dia 31 de dezembro de 2008, mediante apresentação de documento de identificação pessoal e comprovante de residência fixa, acompanhados de nota fiscal de compra ou comprovação da origem lícita da posse, pelos meios de prova admitidos em direito, ou declaração firmada na qual constem as características da arma e a sua condição de proprietário, ficando este dispensado do pagamento de taxas e do cumprimento das demais exigências constantes dos incisos I a III do caput do art. 4o desta Lei.
Parágrafo único.  Para fins do cumprimento do disposto no caput deste artigo, o proprietário de arma de fogo poderá obter, no Departamento de Polícia Federal, certificado de registro provisório, expedido na forma do § 4o do art. 5o desta Lei”; e
“Art. 32. Os possuidores e proprietários de arma de fogo poderão entregá-la, espontaneamente, mediante recibo, e, presumindo-se de boa-fé, serão indenizados, na forma do regulamento, ficando extinta a punibilidade de eventual posse irregular da referida arma.”

Além da tipicidade do crime de porte ilegal de arma de uso restrito com numeração raspada ter se configurado na espécie, a causa extintiva de punibilidade temporária sequer alcançaria a conduta do autor, pois ela ocorreu em junho de 2009, fora do período de abrangência da vacatio legis definida em lei.

Cumpre mencionar que os delitos de posse ou porte de arma de fogo de uso permitido não se confundem com os delitos de posse ou porte de arma de fogo de uso permitido com numeração raspada. São tipos penais diferentes, sendo que os últimos são dignos de maior reprimenda penal, em face na maior dificuldade do seu controle, pelo favorecimento da criminalidade organizada, e para coibir o comércio de ilegal de armas.

Posse irregular de arma de fogo de uso permitido
Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa: Pena – detenção, de um (um) a três (três) anos, e multa.
Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido
 Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
Posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito
Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem:
I – suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato;

O fato de armas apreendidas estarem com suas numerações raspadas afasta a presunção relativa de boa-fé do autor exigida para concessão do prazo legal para entrega, não comprovada por qualquer outro meio nos autos. Vale observar, que pela leitura do acórdão do STF, o autor também foi flagrado na posse de 69 (sessenta e nove) munições dos calibres 38,44 e 32. O autor alegou que o material pertencia ao seu falecido pai.

Outros precedentes:

“1. Abolitio criminis temporária. 2. Posse de arma de fogo com numeração raspada. 3. Vacatio legis da Lei n. 10.826/2003. Inaplicabilidade. 4. A Medida Provisória 417, que deu nova redação ao art. 30 da Lei 10.826/2003, promoveu a prorrogação do prazo para o dia 31 de dezembro de 2008 para os possuidores de arma de fogo de uso permitido ainda não registrada, não abarcando, por conseguinte, a conduta de possuir arma de fogo de uso proibido ou restrito ou com numeração raspada. 5. Ordem denegada” (HC 110.301, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 29.3.2012)”

“A vacatio legis de 180 dias prevista nos artigos 30 a 32 da Lei 10.826 não tornou atípica a conduta do porte ilegal de arma por pessoa não autorizada ou com numeração raspada. II - Precedentes: HC 94158/MG, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, HC 90.995/SP, Rel. Min. Menezes Direito e RHC 86886/DF, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, dentre outros. III - Ordem denegada.” (HC 94.241, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 29.5.2009).

Por fim, cabe uma indagação: Quantos crimes comete aquele que adquire uma arma de fogo ilegalmente? Se o agente sabe da origem ilícita da arma de fogo deve responder por receptação e posse ou porte de arma de fogo. Nesse sentido, a jurisprudência do STJ:

REsp 1133986 / RS - RECURSO ESPECIAL - 2009/0133788-0 - Relator(a)
Ministro JORGE MUSSI (1138) - Órgão Julgador - T5 - QUINTA TURMA Data do Julgamento - 04/05/2010 - Data da Publicação/Fonte - DJe 31/05/2010
RECURSO ESPECIAL. PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA E RECEPTAÇÃO DOLOSA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. NÃO APLICAÇÃO. CONCURSO MATERIAL.
1. Quem adquire arma de fogo, cuja origem sabe ser criminosa, responde por delito contra o patrimônio, no momento em que se apodera da res.
2. Posteriormente, se vier a ser flagrado portando a arma, estará incorrendo na infração penal tipificada no art. 14 do Estatuto do Desarmamento (no qual se protege a incolumidade pública).
3. Portanto, tendo em vista que os crimes em questão possuem objetividade jurídica diversa e momentos consumativos diferentes, não há que se falar em consunção.
4. Recurso conhecido e provido para condenar o réu quanto ao delito previsto no art. 180, caput, do Código Penal, em concurso material com o tipificado no art. 14 da Lei n.º 10.826/2003, determinando-se o retorno dos autos à origem para a prolação de nova sentença.

AgRg no REsp 908826 / RS - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - 2006/0265522-6 - Relator(a) Ministra JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG) (8145) - Órgão Julgador
T6 - SEXTA TURMA - Data do Julgamento 30/10/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 17/11/2008
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA E RECEPTAÇÃO DOLOSA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUTONOMIA DE CONDUTAS. CONCURSO MATERIAL. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A jurisprudência desta Corte admite a revaloração da prova ou de dados explicitamente admitidos e delineados no decisório recorrido, não se caracterizando o vedado reexame do material de conhecimento.
2. Caso o agente adquira a arma sabendo ser ela fruto de um delito, estará cometendo um crime contra o patrimônio no momento em que se apoderar da res. Se depois mantiver consigo a arma, circulando com a mesma ou mantendo-a guardada, estará cometendo o delito de porte ou posse ilegal (os quais possuem uma objetividade jurídica diversa e momentos consumativos ulteriores).
3. Na receptação, sabe-se que o dolo, consistente na prévia ciência da origem ilícita do bem, é de difícil comprovação, porque estágio meramente subjetivo do comportamento, devendo ser apurado das demais circunstâncias que cercam o fato e da própria conduta do agente. No caso, ambos estão a evidenciar a prévia ciência da origem criminosa por parte do recorrido. Se a numeração estava raspada quando da apreensão da arma, ou o acusado já recebeu o revólver nesse estado, o que permitiria afirmar que tinha ciência da sua origem ilícita, pois é certo que quem recebe arma com numeração raspada tem ciência da sua origem ilícita, ou o próprio acusado raspou a numeração, o que faz com que também se possa afirmar que conhecia a origem ilícita do revólver quando recebeu, tanto que queria apagar a numeração original, para evitar futura identificação da arma.
4. Agravo a que se nega provimento.

Fonte: STF e STJ

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